Era uma manhã de agosto. Ensolarada, mas fria. Eu, minha mãe e meu pai saimos pra dar uma volta pela beira da praia, aproveitar o vento fresco, o ar mais puro do que de costume, sentir o carinho do sol em nossos rostos (que coisa mais româtica, não é?). Enquanto caminhávamos, nós falávamos sobre coisas da gente: família, trabalho, atualidades, enfim, conversas jogadas literalmente "ao vento".
Durante a caminhada, eu olhava fixamente para o chão, observando o caminho que aqueles bichinhos de praia, os corruptos, deixavam como rastro. É engraçado imaginar que existe vida em todos os lugares, inclusive embaixo da areia. É bom pensar, ou fantasiar talvez, que exista um mundo só desses bichinhos, onde também há dificuldades, desafios e barreiras a vencer. Ao modo deles, claro.
Então, conforme direcionava meu olhar atentamente para o chão, percebi um rastro um tanto quanto engraçado. Era um rastro fininho que dava várias voltas ao redor dele mesmo, da direita, pra esquerda, voltava para o mesmo lugar de onde havia começado, ia pra frente, voltava, depois recomeçava e ia um pouco mais em direção ao mar. Aquilo chamou minha atenção ao ponto de parar para seguir aquele caminho. Chegando ao final dele estava uma centopéia de praia, com suas centenas de pares de pézinhos, andando depressa, sem parecer saber exatamente pra onde estava indo. Dei risada ao vê-la andando tanto. De certa forma ela estava indo pra frente, mas o caminho a percorrer ainda parecia longo, dependendo do seu destino. Eu, toda curiosa, perguntei pra minha mãe: " - Para onde será que ela quer ir, hein mãe? Senão eu poderia levá-la até lá". E minha mãe me disse: "- Não vai levar ela pra lugar nenhum. Vai atrapalhar ao invés de ajudar".
Meu pai e minha mãe continuaram caminhando, mas eu ainda fiquei um tempo observando o "andar" daquela centopéia. Comecei a imaginar que cada metro quadrado de praia para ela era um novo mundo a ser explorado. Aquela extensão inteira de praia então, era um universo impossível de ser conquistado. Quem seríamos nós, seres humanos, na visão daquela centopéia. Ah, se ela pudesse enxergar além dos seus limites e pudesse ver as coisas com tanta clareza como eu estava vendo, com certeza ela não daria tantas voltas pra não ir para lugar algum. Certamente, sua dificuldade em encontrar um foco em seu caminho seria tão insignificante. Se ela pudesse me entender, eu diria a ela que continuasse sempre reto, se o destino dela fosse o mar. Naquele momento pensei em Deus, no Planeta Terra, olhei pro mar, mentalizei o Universo e me coloquei na situação daquela centopéia diante de tudo isso. Ah, se eu pudesse entender um pouco que fosse sobre toda essa imensidão, impossível de ser explorada por mim. Ah, se eu pudesse entender os sinais que Deus me dá todos os dias pra saber que meus obstáculos são tão pequenos em relação ao infinito, considerado um mistério diante da minha inteligência. Ah, sou tão pequena quanto minha amiga centopéia.
Naquela manhã fria e ensolarada, foi bom encontrar aquela centopéia. Ela, na sua pequenez, ainda assim me ensinou algo bonito. Mas eu, na minha ignorância, não pude ensinar nada a ela.
Por Ana Cláudia Faccin